terça-feira, 16 de agosto de 2011

Do sexo e da mente

O narrador de Nuno Júdice parte da sua memória de A filosofia na alcova para perseguir as memórias do que foi o seu primeiro encontro com o entendimento da sexualidade.
Memórias que o levam, também, a Odisseia ou Em busca do tempo perdido, em busca de referências para definir o seu papel num falhanço amoroso
O livro O Complexo de Sagitário acaba por perseguir a mesma filosofia do livro que homenageia, ou seja, uma intelectualização do acto sexual.
Se bem que aqui o acto sexual não tem a variedade ilimitada da obra de Sade, pelo contrário é a inconcretização do acto que merece a reflexão do narrador.
O seu entendimento de si próprio naquele momento particular de recusa de um corpo feminino ocorre ao olhar para a mente e não para o corpo.
O desejo físico existia mas a visão do que estava para vir falava-lhe do que tinha acontecido em textos que o moldavam. Textos que aconteciam na mesma realidade que aquele encontro, porque a leitura concretiza-se na memória com o mesmo impacto.
O problema não vem do homem e da mulher ali presentes mas dos homens e mulheres que foram antes deles - em texto - que se moldaram na realidade do narrador mais intensamente do que aqueles dois corpos ali prestes a encontrarem-se.
O casal que que por pouco não se concretiza em tudo se compara aos casais que foram e, portanto, em tudo suscita a memória do que haveria de se tornar.
O texto é belíssimo, poético como não poderia deixar de ser, e algumas das dissertações associativas entre a ficção própria e a ficção alheia - aquilo que a sinopse apelida de ensaio mas é, possivelmente, inclassificável - são memoráveis como parágrafos que queríamos
Só que nem sempre os traços de ficção conseguem sustentar o ensaio enquanto este, por momentos, se sobrepõem também à expectativa de composição de uma história (sem que tal tenha de ocorrer em moldes conformistas).
O modelo desta novela, pela necessidade de combinação de elementos em uniformidade sensitiva, é um risco. O belo resultado, apesar de imperfeições, merece que que a leitura seja o nosso elogio a Nuno Júdice.


O Complexo de Sagitário (Nuno Júdice)
Publicações Dom Quixote
1ª edição - Fevereiro de 2011
136 páginas

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