sexta-feira, 16 de agosto de 2013

A protagonista do machismo

Há que dizê-lo desde já e em definitivo, Janet Evanovich não é escritora de policiais. Ou, pelo menos, já não é uma escritora de policiais.
Esta série protagonizada por Stephanie Plum é apenas uma sitcom em que a protagonista se envolve nos mesmos círculos que estão associados aos romances policiais.
Mas considerando a total inépcia - e falta de vontade - de Stephanie Plum para a sua profissão de caçadora de recompensas, bem como o facto de ter uma assistente que também prefere sempre dedicar-se a mais uma refeição do que às pessoas que tem de apanhar, é totalmente impossível que este livro seja um policial.
Os dois únicos protagonistas que poderiam pertencer a um livro policial seriam o polícia e o caçador de recompensas profissional que funcionam apenas como os dois pólos que atrapalham a vida sentimental e sexual da protagonista.
Se estas considerações não são suficientes, consideremos ainda o que é a trama central do livro. Plum está ameaçada de morte por vários indivíduos contratados para conseguir dela uma foto que um estranho, no avião, lhe colocou na mala sem ela saber.
O problema é que a primeira coisa que ela fez foi deitar essa foto fora, quando aqueles personagens em que pensamos como exemplos clássicos de detectives teriam certamente envolvido-se mesmo se fossem meras vítimas do acaso.
Faço agora a análise de um livro para se ler descomplexadamente - de pés na areia, mesmo! - para conseguir umas tantas gargalhadas numa tarde quente.
Nesse âmbito, o livro tem bastante eficácia , com situações embaraçosas em catadupa e personagens de comportamentos inesperados.
Entre outras coisas, Plum enfrenta um Golias de junk food que insiste em roubar-lhe o carro e vai a casa da mãe para ter jantares com a família de onde se destaca a sua velha avó que não tem tento no que diz.
Um pequeno manancial de situações e diálogos exagerados que surgem inesperadamente ao longo do livro.
Mas se o livro tem humor, há uma apreciação crítica mais exigente que se tem de fazer acerca da maneira como a escritora trata a sua protagonista.
O livro contem momentos de total absurdo que nunca se esperariam de uma mulher que quer ganhar a vida apanhando pessoas que não comparecem em tribunal, como não se lembrar de recarregar o taser ou deixar a arma em casa porque lhe pesa na mala.
Considerando que este é o décimo oitavo livro da série, seria no mínimo expectável que a protagonista já tivesse aprendido algumas regras básicas para cumprir a sua profissão. Ou, pelo menos, cumpri-la sem ter de telefonar a um dos seus amantes para que a safe das situações mais periclitantes.
Dá a ideia de que Janet Evanovich está apostada em perpetuar estereótipos machistas, canalizando todos os erros que poderiam ser usados como piada acerca duma "mulher numa profissão para homens".
Avaliando a transição do livro anterior, Perseguição Escaldante, para este, a autora está muito limitada - ou, pelo menos, limita a sua personagem central - a um único cenário onde possa fazer acontecer o mesmo tipo de situações ridículas de forma sistemática.
No final desse livro a protagonista preparava-se para partir para o Havai e no início deste já vem a fugir de lá. Basicamente, o livro que deveria decorrer por lá não foi escrito porque não haveria pessoas para apanhar - e colocar Plum em situações comprometedoras e dependente dos homens.
Não sei se as mulheres aceitam bem este tipo de situação, mas nem mesmo eu sendo homem vejo com bons olhos tal falta de solidariedade femininista da autora para com a sua criação.
Até porque se esperaria que, por esta altura da série e depois de uns três ou quatro volumes de aprendizagem, estivéssemos a ler a superação de uma mulher neste universo de homens durões. Uma caçadora de recompensas mais capaz do que os homens, sem necessitar deles e aproveitando ser uma mulher como mais um truque (e elemento surpresa) para ter sucesso nas suas missões.
Esperava um policial "a sério" mesmo se confesso, com moderado embaraço, que me fui rindo dos falhanços da protagonista que impediram que o livro fosse cair nesse género.


Sorte Explosiva (Janet Evanovich)
TopSeller
1ª edição - Junho de 2013
304 páginas

1 comentário:

  1. Eu li Perseguição Escaldante, porque disseram muito bem do livro e fiquei curiosa com a sinopse, mas foi uma desilusão. Centrou-se demasiado nos romances da personagem principal, os diálogos tinham humor, mas pareceram-me forçados e cheios de palha. Tê-los ou não daria o mesmo resultado. Desiludiu-me imenso. A questão policial ficou muito mal desenvolvida - e isto dito por alguém que nem sequer costuma ler muitos policiais, apenas séries e filmes do tipo - o final é previsivel... Enfim. Tão cedo não volto a pegar num livro da autora.

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