terça-feira, 7 de julho de 2009

Uma viagem pela reflexão

Menschenfresserin de Leonhard Kern

Não sou um leitor habitual de livros de viagens mas quem me conhece sabe que convivo há muito com uma obsessão - saudável e distanciada, descanso-vos desde já - pela prática do canibalismo, sobretudo com as suas implicações morais contemporâneas.
Por isso não pude resistir a ler este livro onde o aventureiro australiano, Paul Raffaele, procurava os últimos praticantes de tal rito.
Ao encontrar motivações tão distintas para o canibalismo, da manutenção das práticas tradicionais à sua utilização como forma de domínio pelo medo ou da superação das regras morais da sociedade à simples delícia gastronómica, o que Raffaele consegue é um retrato da complexidade das próprias crenças e valores que regem culturas (ou mesmo sub-culturas) bastante diferentes daquela em que vivemos.
Raffaele acaba por reflectir ele próprio sobre como tal acto se reflecte nele, mostrando alguma abertura de espírito à razão de alguns povos mantêm a prática do canibalismo, enquanto condena a barbárie cometida no Uganda contra as crianças.
É possível, a um ponto, discordar dele, não nestes dois casos inescapáveis, um perfeitamente injustificável, outro impossível de condenar, mas quando ele opina sobre os Santos canibais do Ganges. Mas, no geral, o que ele manifesta é uma concepção muito certeira da forma como a sociedade ocidental se confronta com estes diversos actos de canibalismo.
Além da discussão da formatação e diferenciação do pensamento, o prazer deste livro está, em grande parte, na forma como Raffaele consegue enriquecer o seu relato com informações histórias, geográficas ou sócio-políticas, sem deixar de vincar o relato de uma forma pessoal, quer opinativa, quer do relato das situações mais pessoais que viveu.


















Entre os canibais (Paul Raffaele)
Publicações Europa-América
1ª edição - Abril de 2009
282 páginas

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