sexta-feira, 17 de julho de 2009

Beber desta vida

A Seco é uma conversa entre amigos a mesa de um bar com uma bebida pairando desconfortavelmente entre os dois.
Uma confissão sem receios que Augusten Burroughs nos faz, desabrigada e profundamente honesta, como se nós fossemos seus amigos profundos.
Se não nos chocar esta impúdica violação de uma luta privada, se não nos chocar aceitar escutar este relato, então seremos capazes de nos enternecer e de nos rir, de ficarmos subitamente desconfortáveis e de sentir orgulho.
Porque há momentos em que a história de Burroughs é risível, outros em que é de uma crueldade que não julgaríamos possível alguém empregar contra si próprio.
E se de facto o tivéssemos à nossa frente, se nos pudéssemos debruçar sobre a mesa para lhe tocar, não saberíamos se o haveríamos de abraçar ou esbofetear!
Conhecer tão por dentro a vida deste homem e a luta deste homem com a bebida - com vitórias, derrotas e novamente vitórias, uma montanha russa de constante rendição, esporádica auto-comiseração, súbita coragem e recuperada determinação - é um aviso tanto como é um prazer de ler.
A confissão, verdadeiramente "a seco", sem ser rude nem brutal mas desarmante na sua frontalidade tranquila, não mais envergonhada mas de uma compreensão interior que receamos só poder ter origem numa destruição prévia, é um tour de force quer para quem a faz (e assim a purga em definitivo) e para quem a ouve, pois agora partilha uma verdade longe de ser facilmente pacificada.
Depois de A Seco, nenhuma bebida será somente uma bebida, será toda uma reflexão, breve talvez, mas nem por isso menos significativa.


















A seco (Augusten Burroughs)
Bico de Pena
1ª edição - Julho de 2008
264 páginas

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