sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Disputar até à harmonia



Depois de terminada a entrevista a Herman Koch vi nas suas circunstâncias um feliz acaso que, enquanto ela decorria eram causadoras de incómodo.
Afinal a entrevista decorreu numa sala de restaurante que haveria de começar a ser preparada para refeições. O som de talheres embatendo uns nos outros é audível ao longo da entrevista!
Um contexto em consonância com o livro que estávamos a discutir, em que o som que se opunha à nossa conversa se tornou numa apropriada banda sonora.
Nisso posso ver, igualmente, a expressão do que foi a entrevista, que foi passando de um confronto para uma conversa.
Um confronto de um autor com o poder das suas próprias ideias e daquilo que um leitor nelas pode encontrar de mais frágil ou menos conseguido.
Um confronto de exigência, de quem gostou do livro, reflectiu e não se contenta. Afinal, tal como o livro confrontou o leitor durante as suas trezentas páginas e lhe faz exigências.
A tornarem o processo mais simples estavam a frontalidade do autor e a sua vontade em esclarecer.
Diria mesmo, a sua vontade em ser confrontado, em vez de responder continuamente ao mesmo conjunto de perguntas a tocarem (nem sequer arranharem!) a superfície dos temas sobre os quais escreveu.
A entrevista foi-se transformando continuamente até ser algo mais agradável, que ousou falar do que está para além do livro.
Houve que cortar partes da entrevista, não porque não houvesse tempo para as incluir, mas porque já eram algo diferente.
Algo cujo interesse poderia não transparecer para os outros leitores d'O Jantar.
Momentos em que não havia já entrevistador e entrevistado, apenas duas pessoas à conversa sobre a Política e a Sociedade.
Momentos de análise em minúcia ao sentido menos claro de uma passagem do livro e se isso resultava da tradução ou já estava no texto original.
Uma entrevista que começou como disputa e acabou como entendimento. (Talvez assim devam ser todas elas.)
Não porque o livro se tivesse esgotado numa única linha de pensamento, mas porque ambos compreendíamos a zona de dúvida em que as ideias tanto colidem como coincidem.
A entrevista terminou com um leitor mais esclarecido e um escritor mais satisfeito.


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