quinta-feira, 19 de março de 2009

Sem erros

Não se fica a dever às quase 500 páginas de O Confessor o atraso deste texto em relação ao anterior - aliás entre o último livro e este momento em que escrevo correram várias centenas de páginas.
Pelo contrário, estas 500 páginas lêem-se em dois dias, sem esforço particular.
Afinal lidamos com um thriller de acção que, surpreendentemente, ainda não está a fazer as delícias de Hollywood.
Percorrendo os caminhos obscuros e secretos (e imaginados) da religiosidade - do Vaticano, sobretudo, claro -, o tema "quente" que sobra entre o fim da Guerra Fria e a generalização do tema Iraquiano -, Daniel Silva cria um imaginário extravagante que está na esteira de narrativas que se considerariam mais novelescas.
Correndo entre vários destinos, várias personagens, várias organizações secretas e várias linhas narrativas, o livro não deixa de anunciar o seu inevitável encontro, fazendo o melhor que pode ao intercalá-las frequentemente.
Com tudo isso, parece ter uma trama complexa mas que, para o leitor atento, culminará numa relação evidente, concluindo o caminho de unificação das linhas narrativas.

Não que isso lhe roube o seu interesse
Mas se um thriller é sempre pleno de energia, a verdade é que depende também de uma certa suspensão, uma criação de um terreno dúbio onde o leitor possa assentar as suas convicções apenas para depois poder vê-las serem roubadas de si.
Daniel Silva segue sempre em movimento, não dando tempo a nada mais do que ao próprio encadeamento dos eventos.
Por isso fica tão fora de contexto a ténue história de amor que se desenvolve.
Tão ténue como as personagens, menos enigmáticas do que simplistas.
Apenas com o protagonista se deve permitir o benefício da dúvida, afinal, como se percebe bem ao longo da leitura, este livro vem na sequência de outros centrados na mesma personagem.
Ainda que, para alguém que pega nele em primeiro lugar, deveriam ser mais inteligíveis os traços principais da personagem-chave.

Entre tudo isto, o que certamente falta a O Confessor é a hipótese do erro.
A história parece deslindar-se com demasiada exactidão, a ponto de anunciar uma linearidade de que o autor tenta afastar-se desde o início.
Não se pressente a quebra dos acontecimentos e, por isso, não se é suficientemente desafiado.
Talvez O Confessor seja o thriller ideal para os tempos modernos, mas continuo a preferir uma resolução que possa nascer quase do lado tosco do ser humano, dúbia e discutível, senão mesmo caricata, o que John Le Carré (a quem Daniel Silva vem sendo constantemente comparado) sabe fazer com mestria.
Sem erros, demasiadamente lapidado, O Confessor não move nem frusta o leitor. E essa é a sua triste e intrínseca falha.



















O Confessor (Daniel Silva)
11 x 17
1ª Edição - Julho de 2008
464 páginas

Sem comentários:

Enviar um comentário