terça-feira, 3 de março de 2009

A inolvidável sede de viajar

Há uma constante surpresa ao longo das mais de 400 páginas de O Viajante Cego.
Não que ela seja propositada, muito menos que seja culpa do próprio livro.
O Viajante Cego está deliciosamente escrito, tão fluído e sedutor que é capaz de fazer a delícia de qualquer leitor.
Por isso é tão fácil embrenharmo-nos nele ao ponto de sistematicamente esquecermos que se trata de uma narrativa biográfica e não um romance, voltando a ser surpreendidos sempre que uma (breve mas pertinente) nota sociopolítica surge.

James Holman (na imagem) foi um viajante compulsivo.
A sua existência mirrava se tinha de ficar parado.
Ele foi o mais intrépido viajante que alguma vez viveu.
A sua cegueira apenas o tornou mais engenhoso, não menos intrépido nem menos determinado.
Mas levou-o também a ser uma figura simultaneamente curiosa e contestada.
Charles Darwin, por exemplo, prestou-lhe o devido tributo, por ter desbravado algum do território que ele haveria de estudar.
Mas os críticos do seu tempo contestaram os seus relatos visuais baseados nos relatos e nos mitos de cada lugar.

A aventura intrépida e inusitada que representa toda esta vida, carregada de angústias, de humor, de tristeza e de incertezas, é um rasgado elogio (não declarado) ao Espírito Humano.
Mas, sobretudo, ao homem que se propôs tão simplesmente a percorrer o mundo desprovido de quase tudo.
E, fazendo-o, dar depois ao mundo o conhecimento que lhe faltava.
Ele, que deveria ser sustentado, protegido do mundo exterior, foi quem mais o desafiou e quem mais retribuiu a um mundo que muitas vezes não o saberia acolher.

O que no final sobressai ainda acima de tudo isto é o sentido de desafio deste relato.
Que um cego faça tudo o que Holman fez é de uma força a toda a prova, mas que o faça apenas para confortar o seu próprio "espírito inquieto" é ainda mais importante.
No fundo, se estivermos dispostos a ver exactamente que vida foi esta, vamos perceber que aquilo a que ela nos desafia é a mais do que enfrentar as nossas limitações, a não aceitarmos a que os outros nos impõe ou, pior, a não aceitarmos o nosso próprio contentamento.
Um livro imprescindível que nos devolve uma figura verdadeiramente mítica!



















O viajante cego (Jason Roberts)
Casa das Letras
1ª Edição - Abril de 2008
450 páginas

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