terça-feira, 31 de julho de 2018

Sem razão para regressar




Não creio que se possa dizer que Phil Klay tem um estilo. Tem uma decente articulação que não chega a ser uma voz.
Daí que os seus contos não tenham variações de tom, nem os seus personagens ganhem distinção à medida do seu protagonismo.
Klay cinge-se aos factos, dando conta da acção com uma precisão informativa a que falta uma exploração psicológica.
Algo que não permita confundir estes contos com relatos verídicos ou trabalhos jornalísticos. E que acrescente personalidade à informação conhecida, para assim justificar que exista a par de tantos outros livros dedicados ao tema da Guerra - e do retorno a ou dela.
Duas razões deverão ser apontadas para tal, uma literária e a outra de identidade. Razões que colidem.
Phil Klay tem o tipo de educação que lhe permite abordar os acontecimentos que presenciou com um sentido crítico que não se ajusta à mentalidade militar.
A experiência que ainda não tem e o talento que poderá não vir a ter, fazem com que ainda esteja na busca pela forma correcta de aplicar a sua ironia. Razão primeira.
Os dois contos que se distinguem dos restantes, OIF e O dinheiro como arma, atestam essa veia irónica, com resultados opostos - percepção acentuada pelo facto dos contos surgirem em sequência.
O primeiro tenta criar a percepção de que é possível haver uma sequência de decisões dentro do exército que levam a uma execução sem saber a quem se responde. O uso exclusivo de siglas devia alhear o leitor da existência de uma estrutura militar mas acaba por o alhear do próprio conto.
O outro é capaz de mostrar o absurdo que se segue à guerra no momento de gerir expectativas e dinheiro para a reconstrução de um país à imagem e semelhança da cultura americana mesmo que não se adapte ao local.
Neste conto o autor liberta-se um pouco das amarras que o exército lhe criou pois trata, em grande medida, da componente civil que interfere na lógica militar.
Essas amarras constituem a razão de identidade que limita a escrita de Phil Klay, visto que ele continua a falar do seu tempo no exército com o laconismo de quem tem as suas acções justificadas por um imperativo ideológico e patriótico que torna desnecessário aprofundar a individualidade dos que serviram o seu país.
Klay corta com a cultura silenciosa do "fizemos o que tínhamos a fazer", escrevendo com precisão sobre o que aconteceu, sem chegar a superá-la nas formas que se esperam de um "autor".
Se é preciso uma prova mais do descrito, isso terá de ser a sensação geral transmitida pelos protagonistas de serem à partida homens perturbados ou com tendência para a inadaptação.
Sentimentos reforçados pela presença em cenários de guerra, em vez de serem descobertas feitas no momento do retorno.
O conjunto de contos de Phil Klay fica como ficção sobrestimada por conta do National Book Award, mais demonstrativo da realidade militar pelas contradições que se percebem no autor do que nos seus personagens.

Desmobilizados (Phil Klay)
Elsinore
1ª edição - Novembro de 2015
302 páginas

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