domingo, 2 de dezembro de 2018

Um Passado para a diversão




Esta é uma série mais propícia a quem já está inteirado do universo Assassin's Creed. Sendo possível seguir a história sem isso, uma pesquisa prévia será útil, pois a série é muito despachada, lançando-se na acção ao fim de 10 páginas.
Aqui, mesmo os iniciados - como a protagonista parece ser - terão de reconhecer que nem uma vinheta de hesitação perante o convite para integrar a Irmandade pode ser demais.
A escolha de uma protagonista parece ser uma das decisões importantes da série, demasiado masculina até então.
Há, aliás, um reforço de personagens femininas, meso entre os Passados visitados, embora tivesse sido mais credível dar a liderança a uma mulher no episódio dos Julgamentos de Salem do que no do Império Inca.
O episódio decorrido em Salem é o mais bem concretizado, aquele em que a releitura do Passado por via do combate entre a Irmandade e os Templários faz mais sentido, mesmo se desperdiça a oportunidade de fazer valer o papel feminino.
A eficácia da releitura permanece enquinada para servir as necessidades narrativas e não a adequação à verdade histórica, cedendo às erradas percepções de que as mulheres eram as vítimas exclusivas e que havia uma liberdade de actuação dos que as julgavam.
Os episódios Inca e Florentino são mais genéricos, com a acção a poder ser adaptada a qualquer cenário histórico.
O episódio Inca é forçado, dando a impressão de existir em serviço exclusivo do quebra-cabeças presente. Serve para obter a resposta a um enigma que permitirá à protagonista juntar-se a uma organização de activistas de defesa da informação em rede e nada mais.
Um ponto mais da ligação da série ao tempo corrente que rouba protagonismo ao Passado, onde Assassin's Creed tem sempre interesse maior. No caso desta banda desenhada, interesse das escolhas perspicazes de detalhes nos momentos mais chamativos.
O thriller de acção que se passa na actualidade deixa muito a desejar, com escolhas pouco originais. Cada tomo da série tem um arco de acção definido para o thriller que pertence a modelos conhecidos e demasiado reconhecíveis.
No primeiro a protagonista liga-se ao Passado no interior de uma carrinha em fuga. No segundo os acordos de lealdades trocadas para que um gangue sirva o lado certo da causa. No terceiro um ataque militar a uma ilha que alberga uma base secreta.
Chegados a este terceiro tomo os argumentistias passam a usar a sua protagonista para avançar a trama à força de decisões idiotas.
O final da série leva mesmo a colocar em causa o valor de entretenimento do resultado global.
O desenho está à altura da trama, o que significa que a sua funcionalidade não esconde as falhas graves.
Neil Edwards tem problemas de consistência, sobretudo com caras. A variação da altura das testas, por exemplo, deforma alguns personagens. Problema mais significativo porque não se limita às vinhetas de menor dimensão.
O melhor do seu desenho aparece no início do episódio Inca. No final do mesmo está-se a ver o seu pior.
Passa-se de cenários convincentes, atenção aos detalhes, fluidez de movimentos e belas faces a uma total falta de expressividade ou textura. Muito aflitivo quando um personagem recorrente do episódio é um velho de volumosa barba negra transformada num bloco hirto.
Ivan Nunes está vários furos acima e a sua aplicação de cores salva diversas páginas. Mesmo ela é atirada abaixo quando o desenho se degrada de tal forma que se passam as páginas apenas lendo o texto. Contra-intuitivo numa banda desenhada.
Fica-se com a sensação de que o desenhador teve problemas com prazos, sinal da incompetência em planear um trabalho consistente.
Esta série é uma leitura propícia a um tempo de inconsequência e que não deveria deixar o leitor com vontade de mergulhar no Passado mais do que, de facto, fez.


Assassin’s Creed vol.1: Prova de Fogo (Anthony Del Col, Conor McCreery, Neil Edwards)
Goody
1ª edição - Fevereiro de 2018
128 páginas


Assassin’s Creed vol.2: Crepúsculo (Anthony Del Col, Conor McCreery, Neil Edwards)
Goody
1ª edição - Abril de 2018
128 páginas


Assassin’s Creed vol.3: Regresso a Casa (Anthony Del Col, Conor McCreery, Neil Edwards)
Goody
1ª edição - Maio de 2018
128 páginas

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