quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A ironia de ser um leitor

Nunca lera Palahniuk até agora. A culpa é do cinema, mais propriamente de David Fincher. Como arriscar ler um autor se o livro dele que se quer realmente ler é o mesmo livro que mais assusta pelo desapontamento que pode causar no momento de comparação?
Claro que quando o filme não é tão bom quanto isso ler o livro é um exercício mais seguro e de potencial constatação de que o autor tinha mais para dizer do que souberam colocar em imagens.
Confirma-se que assim é neste caso, mas não vou seguir o texto fazendo comparações.
Mesmo se não é por este livro que um leitor verá que Palahniuk é um escritor de excepção, dá já para encontrar uma quantidade de ideias que se balançam entre o genial e o absurdo. Uma linha onde se joga o desespero e a ambição.
Palahniuk tem a capacidade de circunscrever as obsessões do mundo a uma mão cheia de perturbados que são os aclamados anti-heróis das gerações recentes que nasceram quando o mundo já não tinha ilusões para oferecer.
Trata-os com uma ironia sacana, acertando piada atrás de piada com as vidas que eles levam, tornando-os tão perturbadores quanto patéticos.
A estratégia é de longo prazo, para no final do filme lhes retribuir com um final feliz, mesmo se ele vem ainda com um traço de destruição.
Estratégia de longo prazo que não salva nenhuma personagem mas que revela a verdadeira ironia que está inscrita na forma como ele lida com os leitores.
Os perturbados são os leitores que se afeiçoaram a um sujeito viciado em sexo, se enredaram na crença de que ele poderia ser filho de uma nova imaculada concepção e se enterneceram com a falsidade da estratégia com que ele conseguia dinheiro para pagar a mensalidade do lar da sua mãe.
Os mesmos leitores que no seu quotidiano teriam desprezado uma pessoa que demonstrasse abertamente apenas uma destas características são os mesmos que idolatram uma personagem miserável ao longo de mais de duzentas páginas.
Os leitores andam todos um pouco desesperados por qualquer figura pouco abonatória (e nada sentimental) que lhes alivie a misantropia. Ou então uma figura com quem se possam identificar sem deixarem de se sentirem melhores consigo próprios por não serem tão loucos assim.
Palahniuk é um inteligente bufão qe está pronto a mostrar aos leitores o grau de ridículo em que vivem ou desejam viver. E isso é o mais divertido de tudo.


Asfixia (Chuck Palahniuk)
Editorial Notícias
1ª edição - Outubro de 2003
260 páginas

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