quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Surpreendido

Fiquei supreendido que este livro funcionasse tão bem a partir de uma estrutura temporal dividida entre o período do rapto da protagonista que corre para se encontrar com a actualidade em que tentam que ela recupere a memória para que o caso se possa resolver.
Uma estrutura que pareceu, por alguns capítulos, propícia a deixar a trama desunir-se como um todo.
Mary Kubica dominou-a de forma exemplar levando a que o ritmo da informação do que se passara antes esclarecesse o que líamos sobre o presente da protagonista sem fazer revelações acidentais.
Levando a que o que pareciam ser dois géneros muito diferentes se fossem transformando num único contínuo narrativo.
O melodrama familiar e romântico a ser escrito como um thriller, género que melhor aproveita e acentua as tonalidades variantes do carácter dos vários personagens.
Contada na sua ordem convencional, esta era uma história de paixão, vingança e culpa. Poderia ter sido um estudo sobre Mia Dennett mas o núcleo de acção - a duração do rapto - teria de ser mais efectivo e não poderia ser explorado de forma demorada como aqui.
Nesta forma temos a oportunidade de admirar o próprio labor da autora e como ela sustenta o efeito principal do livro numa dúvida constante sobre os méritos e culpa de uma personagem central e, por acréscimo, das personagens que com ela convivem mais directamente.
Um efeito principal que não nega os restantes, de engajamento emocional ou choque moral, perante as causas das acções de cada personagem e as consequências com que terão de viver.
Embora a autora tenha encaminhado a história para uma resolução benévola para a sua protagonista - pelo menos em comparação com que o livro a ameaçava até esse ponto - compensa-o com uma revelação que volta a não deixar ninguém incólume naquele universo.
Apesar desta revelação ser fácil de adivinhar dentro de um unvierso ficcional tão estreito no que ao número de personagens diz respeito, tal não pareceu culpa da escritora que mesmo assim fará melhor com mais prática, antes fruto de uma experiência abundante com este género de narrativa, em diversos meios que não apenas o literário.
Mary Kubica conseguiu usar todos os capítulos e os saltos temporais entre eles em favor do resultado capaz de lançar a dúvida sobre os limites a que as pessoas podem ir, para melhor ou pior do que delas se espera.
Manteve o leitor interrogando não só qual era a verdade da história mas qual era a exposição de carácter que ela queria produzir,
Fiquei surpreendido que este livro me mantivesse tão engajado percorrendo uma linha ténue entre o thriller e o romance, entre o sucesso expressivo e o falhanço total.


Não Digas Nada (Mary Kubica)
Topseller
1ª edição - Agosto de 2014
336 páginas

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