Não foi por se tratar de uma história em torno da primeira mulher a assumir a Casa Branca que este livro faz Anne Holt parecer uma autora muito mais americana do que nórdica.
Foi por se tratar de um thriller político bem no limite do absurdo que o leitor aceita para poder terminar o livro, com o rapto da presidente americana quando visita o país dos seus antepassados.
Foi por ser um livro em que a mudança de perspectiva entre intervenientes - mais ou menos directos - marca a estrutura e remete as cenas entre Vik e Stubø para segundo plano.
Foi por se afastar do subtexto a exigir reflexão para estar mais perto do argumento de um filme de espionagem com vilões de estilo exagerado.
Há que dizer que a obra continua a estar embuída do feminismo da autora, que desta vez coloca quatro mulheres num papel plural, de grupo que resolve a trama e que ainda caracteriza o espectro do vasto leque de mulheres - sempre valorosas - na sociedade Norueguesa, ainda que a formação e posteriores acções desse grupo sejam caricatas, para dizer o mínimo.
Ou que é possível ler uma crítica à arrogância dos Estados Unidos da América como polícias do mundo que os faz crer poderem actuar sem restrições em qualquer ponto do globo - embora tal crítica se possa ler em qualquer obra que envolva forças policiais ou militares desse país, por força da consciência crítica do leitor e talvez não das intenções dos autores.
No entanto a conclusão é a de que neste livro o estilo não se assemelha ao dos policiais nórdicos e, pior, não se integra integra com o dos livros anteriores destes dois protagonistas.
Isso torna-se significativo porque o aprofundamento da relação entre Vik e Stubø deveria ser mais perante o surgimento na Noruega do antigo mentor e causador das aflições de Johanne.
Tal acontecimento tem como consequência única que ela sai de casa sem dar explicações a Stubø que, por sua vez, recebeu ordens para servir de agente de ligação ao FBI.
As interacções entre Stubø e Vik tornam-se escassas e dificultadas pela falta de vontade dela e pela ocupação dele.
Tal como as entre os dois homens se reduzem a um desconforto em que Stubø evita os temas que tenham que ver com a sua mulher.
A autora permite-se até um acto de conveniência para o que já devia ser um problema que não imaginava ter criado para si mesma.
Como no livro anterior, a história termina com uma resolução que não o é. Só que as possibilidades em aberto não abrem perspectivas de futuro, fecham as linhas do passado.
O outrora mentor de Johanne é afastado de cena a tiro. Termina a história com ele morto, o que para sempre evita o confronto dos dois (ou dos três, se quisermos incluir o marido dela).
Menos importante na aparência é que a morte dele signifique o encerramento do caso para a presidente americana, o que impede o aprofundamento das causas - próprias e passadas - do rapto em que se viu envolvida e que tinham que ver com a lealdade política e o valor da palavra dada.
Depois do estabelecimento do trauma de Vik ao longo de Castigo e Crepúsculo em Oslo, que a problemática da sua resolução se esfume sente-se como uma traição da autora, tanto ao leitor como aos seus personagens - e até à consistência do seu trabalho!
Reconhecendo que a escrita de Anne Holt, livre do que não é essencial, proporciona um thriller de leitura mais engajada do que o habitual, este acaba por ser um livro inconsequente tanto no percurso dos personagens como na expressão desta "aventura" nesta saga.
Nem mesmo a curiosa (e lida agora, irónica) perspicácia da autora que afirma (e parafraseio) que "pensava que deixavam um negro ocupar a Casa Branca antes de deixarem uma mulher" ajuda a tornar o livro mais significativo.
A Senhora Presidente (Anne Holt)
Contraponto
2ª edição - Janeiro de 2011
296 páginas
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