segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Biografia sem absolutos




Esta é uma biografia que se lê como um romance. Uma afirmação que não quer ser um aval imediato do livro.
Até porque uma biografia não tem de se parecer com um romance para ser uma leitura deleitosa.
O livro lê-se com um ritmo que quase parece de aventuras exóticas, o que tem a vantagem de agarrar o interesse mesmo quando a vida de Maomé é ponto de partida para descrições políticas e geográficas abundantes em enumeração de factos.
No entanto, para sublinhar o interesse da vida da figura no seu cerne, recorre a um estilo de psicologia que coloca a si mesmo em causa.
A autora vai longe demais na interpretação que faz das intenções de Maomé aquando das suas decisões.
Encontra-se aqui o tipo de extrapolação que ocorre sempre em risco, visto que às evidências tem de adicionar uma interpretação pessoal que turva a leitura alheia.
Desde logo porque enquina os dados na direcção do ponto de partida que é o da cultura da própria autora e porque, a partir daí, pode levar a uma reacção de contrariedade quando as opiniões da biógrafa prevalecem no texto em detrimento da constatação das possibilidades à época.
O âmbito do que faz a autora vai além da sugestão de uma hipótese. Trata-se de uma utilização excessiva da linguagem psicológica moderna para encerrar o percurso de um homem.
Uma linguagem com a qual faz uma avaliação sobrecarregada pelo peso dos séculos que passaram.
Sendo-se capaz de reconhecer este excesso da autora e, com isso, não se render a uma crença no livro como conclusão do conhecimento de Maomé, é possível apreciar além da vivacidade do livro o seu detalhe.
A informação comporta uma riqueza assinalável e reconhece-se o prolongado convívio que a autora terá tido com os relatos sobre este homem, capazes de a colocar à vontade para arriscar a interpretação dos seus feitos.
Esse convívio é bom porque a autora se mostra próxima do sujeito, sendo parcial mas não tendenciosa.
Quer isto dizer que ela se mostra admiradora de Maomé - sobretudo no início do percurso dele - mas também crítica à medida que o tempo avança.
Este livro deverá permanecer como uma abordagem com carácter popular (aqui quase sinónimo de ocidentalizado) popular à vida do homem e à construção do seu mito.
Fácil de ler mas a exigir reservas e, mais ainda, uma procura de fontes contraditórias, não tanto complementares.


O Primeiro Muçulmano (Lesley Hazleton)
Elsinore
1ª edição - Outubro de 2015
352 páginas

Sem comentários:

Enviar um comentário