Agatha Christie deve ter escrito Destino: Frankfurt como reacção a um momento do século XX que exigia um outro tipo de ficção criminal.
Um tipo de ficção que se expandisse para lá do ambiente controlado de uma pequena vila inglesa e ocupasse todo o mundo,
Destino: Frankfurt é uma intriga internacional - quase um thriller, direi - repleta de viagens, perseguições, disfarces e ideologias.
É o livro em que Agatha Christie teve de abandonar o cenário que lhe proporcionou os seus melhores trabalhos, aquele mundo em que o crime é apenas uma leve mancha no carácter decente e cavalheiresco do Reino Unido - e sempre rapidamente removida.
Um mundo inocente em que até uma velha solteirona de St. Mary Mead consegue resolver os casos baseando-se apenas nos seus muitos anos de observação da natureza humana (ou coscuvilhice, se preferirem).
Esse mundo era o ideal para o requinte imaginativo que Agatha Christie colocava nos seus crimes. Não só porque recuperaria a sua imaculada existência, mas porque ajudava ao efeito de surpresa do acto criminoso mais feroz.
Num romance de espionagem internacional, a inocência está perdida e o crime torna-se na ferramenta mais comum do trabalho.
A desconfiança assegura que os seus protagonistas sobrevivem e, por mais cerebral que possam ser, a sua intervenção no terreno faz a diferença.
Basta o início do livro para o revelar, quando um cavalheiro inglês
acede ao pedido de uma desconhecida para lhe permitir usar a sua
identidade para apanhar um voo no qual foge salvando a sua vida. Não só
isso como ainda se permite ingerir uma bebida que ela própria lhe
confessou ter adulterado com algum sonífero.
Ele ainda se
interroga sobre se não foi um risco tal atitude, mas perante uma donzela
em apuros, ele é de uma elevação a toda a prova que vai acabar por o
colocar na rota de graves perigos.
Perante esta conjugação de factores, o livro em que Agatha Christie abandona a segurança dos seus cenários mais inocentes torna-se, igualmente, naquele em que ela os defende.
Fica claro que Agatha Christie não conseguiu escapar à sua própria natureza e que tentou influenciar o novo género, que ameaçava o seu policial, negando-o.
Muito do livro é um conjunto de conversas (entre o discurso e o debate) onde se discute a violência corrente, alguma política e bastante filosofia de valores.
Destino: Frankfurt seria Hitchcock se este não retirasse as partes chatas à vida. Aprende-se com este livro de Agatha Christie o quanto o Mestre estava correcto na lição que tinha para dar.
Estamos, pois, perante um trabalho de Agatha Christie a evitar em absoluto. Os que aqui ficarem avisados, saltem directamente para o próximo livro à espera de uma oportunidade.
Destino: Frankfurt (Agatha Christie)
Edições Asa
1ª edição - Maio de 2012
272 páginas
Carlos, concordo com a tua opinião.
ResponderEliminarLi este livro e achei o mesmo.
http://silenciosquefalam.blogspot.pt/2012/07/destino-frankfurt-de-agatha-christie.html
boas leituras,
1 abraço