O primeiro tomo de As Águias de Roma coloca-nos no rumo de uma passagem à idade adulta de dois rapazes que se antagonizam mas que acabarão como irmãos de sangue.
Dois rapazes educados em conjunto vindos de origens civilizacionais diferentes - embora com pontos de contacto - e cujo crescimento exemplificará como a dureza de Roma - sobre os seus "filhos" e sobre os povos conquistados - proporciona tanto as capacidades para o sucesso como uma continuada revolta muda contra a hierarquia.
Trata-se de um bom início de história, sem ideias originais, com uma boa abordagem aos detalhes que diferenciam dentro de uma mesma situação o amadurecimento precoce e a infância prolongada.
A distinção é feita pelos pequenos contrastes entre o bárbaro - proveniente de um mundo masculinizado e viril, até mesmo selvagem, a quem foi negada uma infância - e o civilizado - protegido pela mãe, ainda de volta dos brinquedos e largamente inexperiente (na violência e no sexo).
O interesse na reconstituição do século I a.C. vale mais pelos momentos de alguma intimidade e não pelo retrato da vida nos domínios de Roma.
Estamos longe de um Alix e aqui a acção toma precedência sobre a "descrição" (visual incluída).
Isso torna a história mais linear do que prometia ser, pelo menos até chegar o cliffhanger - inevitável para justificar a história e, por isso, não tão surpreendente quanto o autor julgaria.
Sente-se a falta de um maior equilíbrio entre as vidas a solo dos protagonistas contra aquela que têm em conjunto, algo que teria evitado uma ligeira sensação de estereótipo no esboço das motivações dos personagens.
Essas deveriam desenrolar os acontecimentos no segundo tomo com alguma rapidez, mas este demora-se numa relação amorosa cujas implicações serão importantes mas não essenciais à História de Roma e à relação entre Marco e Ermanamer.
Apenas o último quarto do livro se dedica aos aspectos da guerra que ajudarão a definir o carácter futuro destes dois actores do belicismo e da política e as bases do confronto que entre eles se estabelece.
Este tomo mostra-se muito desequilibrado, com a maioria do livro assemelhando-se a um melodrama novelesco cuja única função é permitir a Marini exibir corpos nús e cenas de sexo variadas.
Este seria um mal menor se o autor se apropriasse do estilo do peplum - a história bem que deles se aproxima - e quase se abstraísse da existência de cenários bem recriados em favor de representações reconhecíveis pela sua função e tradição ficcional.
Pelo contrário, o livro passa-se em plena Roma o que leva a que as imagens da cidade se aproximem de postais de cenas de rua falhados em dar noção da vida que ali houvesse.
O próprio desenho vacila, havendo grande investimento nas personagens centrais (que se desnudam) e legando às restantes a feiura, pelas características a elas atribuídas e acrescidas de um desenho pouco sólido (ou esforçado).
Mesmo com os protagonistas há vinhetas - que não grandes planos - que parecem ter sido despachados, criando inconcistências nas suas feições.
O resultado lê-se como uma intermitência na história da qual sai um resumo (as pranchas sobre a guerra estão carregadas de texto) que permite que esta continue para mais um volume.
O segundo tomo d'As Águias de Roma resulta num falhanço dramático em nome de uma compensação artística que não chega a acontecer.
O terceiro tomo volta a centrar o foco da história, mesmo se as ligações românticas (antigas e novas) continuam a ter ingerência sobre ele.
Um regresso à narrativa dos dois irmãos de sangue e de como a relação entre ambos - com (re)aproximações e (re)afastamentos - afectará o domínio romano sobre a Germânia.
As relações pessoais e as maquinações políticas começam a funcionar integradas e o interesse da história acompanhada está mais perto de se revelar.
Trata-se do livro melhor escrito de entre os três, mas afectado de males nascidos ainda dos problemas que se viram no tomo anterior.
A expectativa sobre o acompanhamento dos momentos mais significativos da formação dos personagens e dos acontecimentos que vivem quando afastados vê-se gorada pelo desperdício de folhas no tal caso amoroso.
A terceira parte da saga d'As Águias de Roma, quer por si só quer pela relação com o tomo precedente, revela até onde chega o mau domínio dos tempos narrativos por Enrico Marini.
Afinal ele termina este tomo com uma cena já meia decorrida, algo já muito distante do cliffhanger do primeiro tomo mas revelador de uma má composição da história em relação ao espaço disponível.
A própria capa sugere uma incompletude deste livro, sendo a única sem os dois protagonistas. Como se a outra metade desta porção de história estivesse guardada para o livro IV e, se assim for, tal deveria ser indicado pois o próximo livro terá de começar no seio da acção, retirando a dois tomos a sua autonomia narrativa - fechada mesmo que não concluída - que se esperaria garantida a cada tomo.
Se avaliarmos isso a par do desenho, que opta vezes demais por cenários pouco elaborados ou sujeitos a um artifício que permita compôr o fundo recorrendo apenas a uma cor, ficamos com a ideia de que passou a ser a urgência do tempo editorial a comandar a continuação desta história.
Neste ponto a avaliação é a de uma série incerta, vacilante no desenho e pouco cuidada na narrativa. O quarto volume está prestes a ser lançado no nosso mercado para confirmar ou desmentir essa sentença.
As Águias de Roma - Livro I (Enrico Marini)
Edições Asa
1ª edição - Maio de 2011
60 páginas
As Águias de Roma - Livro II (Enrico Marini)
Edições Asa
1ª edição - Junho de 2011
60 páginas
As Águias de Roma - Livro III (Enrico Marini)
Edições Asa
1ª edição - Novembro de 2011
60 páginas
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