Este é o livro que se deveria ter seguido a Morte com Vista para o Mar, o livro em que Gabriel Ponte progride das saudades da investigação provocadas pela sua assistência ao caso da ex-mulher para uma tentativa de se tornar num detective privado.
Ao bom estilo dos polícias caídos em desgraça, um detective privado sem licença e dependente de favores antigos que nem deveriam ser cobrados.
Algo particularmente interessante num país onde o conceito de detective privado parecer não estar legislado.
Contratado por dois Romenos em busca de uma rapariga, Gabriel Ponte tem de mover-se nos limites da Lei, umas vezes do lado correcto para poder recorrer aos seus conhecimento na Polícia Judiciária, outras do lado errado para poder actuar como a polícia não pode.
Tudo mantendo uma fidelidade moral ao seu sentido de rectidão que será inevitavelmente testada contra uma rede criminosa bem urdida e sem quaisquer escrúpulos.
Depois de no primeiro livro ter surgido um retrato onde o pior do Portugal actual intersectava o mais mesquinho do Portugal de sempre, Pedro Garcia Rosado proporciona agora um retrato mais amplo de uma Europa onde todos os negócios se tornaram possíveis e que, por isso, deixou de ser criteriosa, tornando os países periféricos em entrepostos de todo o tipo de itens, até os que não o deveriam ser.
Mesmo que o vilão deste livro seja uma espécie de líder de cartel, muito organizado e cheio de artimanhas, acaba por ser este o tipo de realismo a que se deve aspirar nos livros de Ponte.
É um mafioso e, ao mesmo tempo, um líder comunitário influente, capaz por isso de se mover nos mundos visíveis e subterrâneos onde o poder se perpetua.
Um realismo não tanto da história, mas do contexto da mesma, que mantendo-a assente na realidade presentes impede que se torna num chorrilho de exageros (como no caso das ruínas de um coliseu romano tornado em ringue de combates até à morte de Morte na Arena).
Tem de se apontar ao autor uma falha, ainda assim, um retraimento nas descrições das "cenas chocantes" a que a história dá origem.
Não por um valor de "choque", mas para retirar o leitor do seu conforto e com essas cenas levar o leitor a uma reflexão para lá do fim do livro. Além de terem todo o potencial para reforçar o carácter dos personagens.
O aviso na capaz é um chamariz que não se sente estar justificado, tendo os mesmos efeitos de distorção de uma classificação etária excessiva atribuída para proteger algum do público potencial.
No restante é a qualidade de Pedro Garcia Rosado a proporcionar uma história coesa e repleta de tensão continuada - depois de um segundo livro em que parecia gerada de forma artificial através de alguns episódios mais trabalhados.
Sobretudo com o aproveitamento de personagens secundárias como (e sobretudo) Ulianov, vindo de uma outra saga de livros do autor.
Este aspecto, que já se verificava no livro anterior, denota uma inteligência do autor que capta o interesse de leitores agora chegados para os seus livros anteriores.
Ainda mais interessante é a maneira como essa utilização de personagens de um micro-universo para outro criam uma sensação de macro-universo ficcional em potência no qual o cruzamento de protagonistas poderia gerar novas hipóteses, de multiplicação das linhas narrativas e de avanço da extensão geográfica da acção.
Parece-me, estruturalmente, o melhor dos três livros lançados até ao momento mesmo se acaba com um cliffhanger exagerado - de novo Ponte como herói de acção e não o personagem que já foi contruído - que precisará de uma explicação muito boa.
Fica-se em suspenso mas com a certeza de se vir a reencontrar Gabriel Ponte. E. quanto a isso, não há dúvidas de que é o que se quer!
Morte nas Trevas (Pedro Garcia Rosado)
Topseller
1ª edição - Maio de 2014
352 páginas
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