Morte numa Noite de Verão é uma exploração dos meandros da sociedade Norueguesa, usando para tal uma ideia genérica de Policial como suporte preferencial.
A investigação toma o lugar central do livro, sem que seja ela a guiar a trama.
Na verdade trata-se de uma investigação realista levada ao detalhe, onde o interrogatório das personagens tem particular relevo.
O processo de investigação nesses moldes permite que ao longo do romance as características das personagens vão sendo reveladas de forma controlada, sobretudo ao mesmo ritmo que os inspectores as descobrem.
O que está escondido e só pode ser revelado a um segundo ou terceiro interrogatório, mais duro e mais acusatório, no que ao fim e ao cabo é o mesmo trabalho de descodificação social que todos fazemos, apenas intensivo.
Os polícias, perante um crime, estão obrigados a chegar ao verdadeiro negrume que se esconde abaixo da reluzente superfície social - particularmente reluzente num país como a Noruega, cremos nós - até ultrapassarem aquela ideia de que "nunca conhecemos verdadeiramente uma pessoa".
Não há excitação nesse seu trabalho, o verdadeiro interesse vem do mosaico psicológico que eles têm direito a ver no seio de um grupo de pessoas que se têm em boa conta.
Um direito que se torna um privilégio para o leitor que lida com essa personagem colectiva de relações dinâmicas mas escudadas que se formam no seio do grupo de priveligiados e com aqueles menos afortunados que eles se decidem a ajudar e a acolher.
Numa tentativa de se sentir melhor acerca de si mesma, a classe alta da sociedade local exibe - para si mesma! - o sucesso da sua generosidade, integrando uma bela jovem ex-toxicodependente nas suas festas.
Um elemento estranho entre a muito organizada - e comprometida - classe alta faz despertar a violência natural do animal denominado como ser humano, tão bem escondida debaixo de todas as restrições sociais,
A enorme dose de suspense que mantem o leitor colado à página vem dessa metódica exploração da psicologia mais primária que existe em todos os que estão à nossa volta.
O que este trabalho de "romance social" implica é uma menor importância individual das personagens dos inspectores, Frølich e Gunnarstranda.
A construção dos dois não é aprofundada para além do estritamente necessário para que eles estejam em confronto com o grupo de suspeitos.
Até mesmo a forma como se relacionam um com o outro está reduzida a uma eficácia muito nórdica e muito masculina.
Nada disso ajuda a criar-se uma empatia para com esses dois personagens, nem a esperar pelo seu regresso noutras investigações.
Não é grave que assim seja, pois este fresco acerca da sociedade Norueguesa contemporânea é um romance sólido e poderoso.
Mas teria sido útil para levar o livro a ser mais comunicativo para com os públicos que não os do país de origem de Dahl.
Sobretudo para integrar melhor um certo moralismo com que o autor se permite dirigir aos seus conterrâneos e que ficaria melhor integrado se viesse da parte de dois detectives melhor caracterizados na sua velhice conservadora.
Mal menor para um livro que, apesar das comparações feitas na capa, não coloca o seu autor ao génio com que Henning Mankell abordou os policiais.
Morte numa noite de verão (Kjell Ola Dahl)
Porto Editora
1ª edição - Junho de 2014
368 páginas
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