quinta-feira, 6 de maio de 2010

Amor cínico

Um livro sensível sobre o amor pode esconder uma tenebrosa teoria sobre tal sentimento. Ou, senão tenebrosa, pelo menos lúgubre.
O amor é o sentimento mais extraordinário e mais inspirador do mundo, capaz de tornar os adolescentes do livro em "almas velhas", capaz de fazer de um velho homem um inesperado ladrão de campas.
Só que o amor é, como todos os sentimentos, nascido de circunstâncias irrepetíveis, e mutável perante as alterações ao tempo que o viu florescer.
O que este livro diz, de forma velada, escondido numa história de amor que deixará muitos comovidos, é que o amor é mais belo quando é vivido brevemente e, à sua maneira, nunca plenamente concretizado.
Este amor, completo por ser sentido mas incompleto para aqueles que o sentem, preserva-se, vive como ideia aperfeiçoada e incorrupta, é eterno.
Na história de amor sofrido de um rapaz que vê a namorada morrer de leucemia, depois de ter ajudado o avô a roubar as cinzas da mulher com quem não se pode casar para com ela ser enterrado, há pois um certo efeito subversivo.
O de fazer de um belo amor apontado à eternidade a evidência de que o amor apenas se torna eterno se não for vivido. Ao ser vivido, mesmo da forma mais bela possível, torna-se em algo que não se pode nomear da mesma forma.
O livro, afinal, é um romance tão eficaz para os românticos como para os cínicos, escrito com sentimento mas sem pieguice, terno mas criticamente perspicaz.
Será por isso que vendeu tanto, por ter sabido dar a todos aquilo que querem (ou não querem) ver no amor?


















Um grito de amor desde o centro do mundo (Kyoichi Katayama)
Alfaguara / Editora Objectiva
1ª edição - Novembro de 2009
200 páginas

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