sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Duas hipóteses

O livro de Paolo Sorrentino teve origem no argumento do seu filme, numa inversão que costuma ser mais habitual em blockbusters.
A versão literária da história do filme costuma servir para potenciar os lucros mas o caso d'A Juventude é o aproveitamente de uma sensibilidade pessoalíssima.
Claro que cada um apreciará ou não essa sensibilidade, sobretudo se tiver visto o filme antes de chegar ao livro.
Quem tiver achado o filme mau deverá evitar por completo o livro pois o seu defeito é, precisamente, ser fiel a esse.
O livro é o argumento do filme, como fica bem legível em diversos momentos que são como referências apontadas aos vários técnicos e actores que lhe viriam a dar forma.
O polimento do texto ficou pela metade, retirando-lhe indicações cénicas, mas não o levando por completo de guião a novela.
Esperava-se que Sorrentino tivesse proporcionado mais algum desenvolvimento à sua aproximação despojada à história.
Não apenas descrições que substituíssem o que a imagem proporciona, também algo que nos desse maior discernimento acerca dos personagens.
Aquilo que os actores conseguem transmitir ao serviço do realizador e que como escritor ele teria de expressar de uma maneira mais explícita.
Em contrapartida, numa tentativa de percepcionar o livro sem a sua ligação ao filme - e ignorando aquilo que o denuncia como tendo origem num argumento - podemos encontrar um conto que tende para um estado de liberdade.
Liberdade de amarras estruturais, que procura livrar-se de tudo excepto da colocação de personagens singulares em cenários sugestivos quer literaria quer cinematograficamente. Como se fosse uma aproximação leve a Thomas Mann (e Luchino Visconti) ou Federico Fellini.
Uma aproximação que rejeita a densidade porque quer expressar na forma do próprio texto o niilismo sábio - e egoísta! - dos personagens.
A novela tenta dar forma às suas discussões que não chegam a ser filosóficas, são apenas procuras de coordenar duas formas distintas de desistência perante o mundo.
Entre estes dois julgamentos a que se submete A Juventude há espaço para outras tantas conclusões.
De que este livro é uma curiosidade que dá um vislumbre do processo de criação que leva a um filme.
De que Paolo Sorrentino pode ser um escritor interessante caso procure escrever livros e não adaptar guiões.


A Juventude (Paolo Sorrentino)
Jacarandá Editora
1ª edição - Novembro de 2015
144 páginas

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