Há muito de distinto entre Ara e Cinerama Peruana, mas há igualmente muito de semelhante. Isso será um sinal do porquê de serem ambos dois dos melhores livros que saíram o ano passado (independentemente da nacionalidade de origem, se é preciso dizê-lo).
Aquilo que têm de semelhante será um ponto de partida interessante para esta crítica, tal como a leitura em sequência destes livros permitiu que um e outro crescessem perante o leitor que assim teve a sorte casual de lhes pegar de seguida
Ambos os romances estão estruturados em peças independentes que se unem pelos sentidos que só se podem encontrar no momento em que todas elas foram lidas pela ordem estabelecida.
E ambos são agregações da essência das possibilidades da Literatura, citando e inovando fontes essenciais.
Se no caso de Ara a citação era das próprias forma literárias, em Cinerama Peruana é das referências, autores essenciais a uma aprendizagem da "Gramática Unviersal" da melhor Literatura: aquela que cresce, também, pelas pequenas falhas.
Rodrigo Magalhães é leitor, livreiro e agora escritor, pelo que ganhou em primeira mão as múltiplas experiências do prazer de se relacionar com as palavras, os livros e os autores.
Quando remete para um dos escritores da sua (p)referência é porque não tem embaraço de confessar que foram eles a ensinar-lhe e inspirar-lhe o que agora lemos.
A revelação das bases serve para demonstrar o que conseguiu inventar a partir delas, aquilo que é ensinamento da leitura e aquilo que é inspiração da escrita.
Depois cada um dos contos que constituem o livro encontram-se nos temas e distanciam-se na expressão dos mesmos.
Herança, Violência, Literatura. Combinados ou desirmanados, dão mote a cada personagem - ou conjunto de personagens - trazidos a uma ribalta de interesse ficcional que nasce do lado humano negro.
Mais importante ainda entre os textos - porque se associa ao sentido geral do trabalho do autor neste livro - é o denominador comum da tentativa de superação da genealogia (teórica) que assombra cada um dos personagens.
E como essa tentativa gera lealdades - sempre em risco - para com obras permenanetemente inacabadas e que, sejam de colocar palavras no papel ou corpos na terra, continuam a ser fruto de trabalhos cansativos, exigentes e mecanizados.
Sendo Cinerama a visão cinematográfica abrangente de uma mesma realidade com base em três projecções simultâneas, não há dúvida que Rodrigo Magalhães muito se aproxima dessa ideia, dando conta de um mundo que lhe vem dos livros e que ele trabalha cerradamente com um domínio das melhores qualidades de escritor mas que tem uma abrangência que se percebe de imediato mas que só o tempo - e obras adicionais, crê-se e espera-se - poderão chegar a desvendar por completo.
Cinerama Peruana (Rodrigo Magalhães)
Quetzal Editores
1ª edição - Junho de 2013
232 páginas
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