Na capa está explícito que este livro é um Romance mas a sua forma - com peças tão distintas - é outra que temos de aprender a conhecer melhor.
Este texto guarda espaço para a poesia, uma aproximação ao ensaio, um teatro do pensamento e a ideia de conto.
A autora surge à procura da maneira como todas estas formas são capazes de existir dentro da etiqueta tão abrangente do Romance.
Essa é a demanda a que mais facilmente responde, com uma crença nas possibilidades do Romance que a levam a este trabalho de experimentação.
A procura mais firme não é a dessa ideia geral do que pode estar num Romance, mas de que todos estes textos possam estar juntos e formar este romance em particular.
O livro procura que a independência de cada uma das suas narrativas - em sentido lato - permaneça intacta num percurso ordenado dentro da globalidade que leva o nome de Ara.
Ara é uma daquelas palavras que se aprendem por acaso por via de umas palavras cruzadas feitas num tempo que a memória perdeu.
Sinónimo de altar e recurso recorrente para ligar outras palavras, dando nome à obra fala-nos, nem que seja inconscientemente, de uma reverência à Língua Portuguesa e à forma de a potenciar - radicalizando-a dentro de normas conhecidas -; e de uma ligação por intersecção de várias narrativas para um conceito final que possa ser chamado de romance.
E o que se coloca num altar? Amor e sacrifício.
Esses são os pontos de intersecção que definem como estas histórias se tornam unas.
Ana Luísa Amaral está à procura de falar do que une duas pessoas - sem que importe o género, embora num dos momentos memoráveis do livro essas pessoas sejam ambas mulheres - e que também une todas as pessoas deste mundo.
Amor como sinónimo de humanidade e como matéria universal de escrita, sem reduções do seu sentido absoluto.
Daí o sacrifício como contraparte desse amor, a individualização de cada vivência que seria banal de tão comum estado de graça.
Os temas maiores do romance estão em consonância plena com o exercício de estruturação do mesmo, uma busca indissociável da outra: como voltar a falar de Amor não sem repetir o que foi escrito e como foi escrito.
Essa busca da autora é, também, a sua busca pelo leitor, de que este se cruze pessoalmente com os sentimentos vividos pelos personagens e mesmo assim seja surpreendido por tudo o resto que é inerente ao trabalho puro de escrita que nunca está domado por uma ideia de romance mas extende-se até àquilo que poderíamos chamar de argumentação dialogada sobre a condição feminina.
Ara é um daqueles livros que nos abençoa com uma condenação, a de a ele voltar ainda várias vezes dentro da procura das possibilidades para o seu efeito de conjunto.
Ara (Ana Luísa Maral)
Sextante Editora
1ª edição - Outubro de 2013
88 páginas
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