sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Não há ironia que chegue

Sobevivemos a mais uma mania sobre o fim do mundo, portanto podemos agora ler com ironia as ficções em torno do dia 21 de Dezembro de 2012.
Este é um caso em que a ironia deve estar bem activa e, mesmo assim, não creio que no final o livro se safe com isso.
Este é um thriller com a estrutura a que os leitores já devem estar bem habituados, adicionando partes iguais de misticismo e ciência, de História e Ficção Científica.
O equilíbrio entre as partes não é nada difícil porque estes elementos surgem como salpicos de tempero atirados para o meio de um molho já engrossado e cujo sabor domina tudo.
Ou se aceita cada uma das ideias que os autores lançam e não tentam contextualizar ou então passam-se centenas de páginas a perguntar "Mas que raio se passa aqui?".
Os elementos principais são tão díspares quanto um cobói que se torna imrotal após (acidentalmente) limpar o súor ao Véu de Verónica e a clonagem de múltiplos genocidas a partir dos seus restos mortais.
Mesmo somando a tal Montezuma (também tornado imortal quando se cruzou com os Espanhóis), não há maneira de o livro aprofundar um desses temas-chave e deixar de se dedicar a explosões, perseguições, agências secretas, locais exóticos e escritores tornados heróis de acção.
A necessidade de adiantar a acção acaba por transformar cada ideia num trampolim para mais uma cena, impedindo qualquer profundidade ao material.
Até a ideia mais rebuscada - e aquela que dá nome ao livro -, a da recuperação de gente como Himmler ou Bloody Mary para se tornarem salvadores do mundo, matando alguns milhões de pessoas em sacrifício aos deuses, se torna numa espécie de MacGuffin para fazer arrancar a leitura, visto as doze terríveis personagens (mais um toque de Cristandade para Montezuma...) nunca chegarem a concretizar coisa alguma. Estes Apóstolos não estão no livro senão para servirem de capangas ou para morrerem.
Acabamos defronte do revisionismo de um género formulaico, agora balofo de pseudo-intelectualidade: temas de nicho transformados em motivos de interesse por uma actualidade breve e um interesse esporádico mas cujo núcleo está sempre vazio de substância.
Piora o livro com a má qualidade da personagem central, pouco impositiva e ainda menos interessante que ainda consegue escolher como adjuvante um escritor de best-sellers de temática polémica e qualidade duvidosa que não.
A sua melhor qualidade é mesmo ter um pai que nunca conheceu mas que quer retomar o contacto com ela... e que, para tal, tem o apoio da sua antiga rede de espionagem. Algo que dará bastante jeito para as situações apertadas em que ela se vai meter.
Até ao final do livro, apesar da sua previsibilidade, o meu grau de ironia bem me levou a desejar que o mais absurdo e cruel dos planos fosse, afinal, aquele que salvava o mundo.
Que se tivessem, realmente, de sacrificar os tais milhões de humanos para apaziguar entidades superiores e salvar a vida aos biliões que ainda restassem, marcando a data da profecia como aquela em que a Humanidade alterava o seu entendimento de si mesma, agora mais um recurso como outro qualquer: o sangue brotando de nós como o petróleo da Terra.
E que se levantasse uma nova dúvida moral sobre o papel que os vilões tinham no equilíbrio do mundo...
Nada disso se concretiza claro, não se choquem os leitores, e a ironia que se espera ler é a ironia que só está na nossa mente.
A única ironia verdadeira é a de que perante a mais ténue hipótese sobre o que aconteceria, lá fomos lendo até ao fim. Deve ser o grande truque deste género de escritores, fazerem-nos esperar que se contrariem as expectativas mais básicas - e ir lendo - apenas para nos darem exactamente o que lá haveria de estar.


Os Apóstolos da Fénix (Lynn Sholes e Joe Moore)
Publicações Europa-América
Sem indicação da edição - Dezembro de 2011
380 páginas

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