Foto de Bertien van Manen |
Sente-se como injustiça a tradução do título do livro de J. D. Vance como Lamento de uma América em Ruínas.
A desaparição da respeitosa poesia do título original é secundária em relação ao julgamento que ele estabelece em quem lhe pegue.
Um julgamento de carácter europeu, daqueles que apenas entendiam a América cosmopolita, cuja afinidade maior é com o próprio Velho Continente.
Não se lê no livro a intenção do autor em acusar a sociedade em crise do subtítulo. Expô-la ao entendimento do restante do país - e, depois da eleição de há um ano, restante do mundo - isso sim.
Até porque o retrato da sociedade em crise, vem por associação à outra metade do que refere o subtítulo.
A família de Vance é o tema maior do livro, feito dos vícios dos pais e da grandeza dos avós. Os primeiros figuras asquerosas. Os segundos - especialmente a matriarca - extraordinários.
Da família dele partir-se-á para o resumo daquele conjunto de pequenas comunidades que se repetem até constituírem o Rust Belt.
Entre as características que se destacam nos seus estão o arreigado sentido de pertença, a permanente lealdade à família (que sendo extensa é, muitas vezes, quase toda a comunidade) e a feroz independência para com as formas de poder.
A família dele não mostra apenas o lado bom deste isolamento em defesa própria, mas mostra sobretudo algumas das boas consequências delas ou não tivesse Vance tornado-se advogado via Yale.
A figura impositiva e motivadora da avó, que o protegeu do lado mais pernicioso daquela cultura muito contribuiu para isso. No entanto é o próprio a admitir que depois necessitou da estrutura proporcionada pelos marines para atingir o potencial da sua inteligência interessada.
Constata-se que é uma estabilidade prolongada que lhe permite fazer uso daquela ferocidade saloia para se impôr num mundo para lá da faixa de território a que estava confinado inicialmente.
Vem daí a riqueza da perspectiva de J. D. Vance, dele ter conseguido atravessar a brecha entre classes sociais e se aglutinarem nele as duas faces dos Estados Unidos que agora conhecemos.
Já não é apenas o "saloio". Continua a amar aquela comunidade, mas a admiração não vem sem um sentido crítico.
Tough love que ele dirige a quem ele sabe que pode alcançar mais, assim uns queiram e outros os deixem.
A família dele não mostra apenas o lado bom deste isolamento em defesa própria, mas mostra sobretudo algumas das boas consequências delas ou não tivesse Vance tornado-se advogado via Yale.
A figura impositiva e motivadora da avó, que o protegeu do lado mais pernicioso daquela cultura muito contribuiu para isso. No entanto é o próprio a admitir que depois necessitou da estrutura proporcionada pelos marines para atingir o potencial da sua inteligência interessada.
Constata-se que é uma estabilidade prolongada que lhe permite fazer uso daquela ferocidade saloia para se impôr num mundo para lá da faixa de território a que estava confinado inicialmente.
Vem daí a riqueza da perspectiva de J. D. Vance, dele ter conseguido atravessar a brecha entre classes sociais e se aglutinarem nele as duas faces dos Estados Unidos que agora conhecemos.
Já não é apenas o "saloio". Continua a amar aquela comunidade, mas a admiração não vem sem um sentido crítico.
Tough love que ele dirige a quem ele sabe que pode alcançar mais, assim uns queiram e outros os deixem.
J. D. Vance reconhece os problemas que causam as características admiráveis de que os seus avós fizeram armas para o bem dele.
A pertença torna-se numa recusa da mudança estrutural quando o território se tornou ermo de oportunidades.
A lealdade torna-se na incapacidade para compreender as característica da nova América que continua a progredir.
A independência torna-se numa incapacidade para aceitar as devidas intervenções que o
Nada disto é absoluto e Vance aborda a preguiça que se impôs aquando da perda dos trabalhos que eram a coluna vertebral dos Estados Unidos.
Este é o ponto em que se começam a notar as contradições internas dos que clamam por mudanças sem fazer algo para isso.
Há uma crítica que se sente ser mais feroz quando fala dos que se recusam a lutar em benefício próprio e preferem repetir lamentos por um passado próspero que, em certos casos, nem chegaram a conhecer.
Uma crítica que atinge o seu píncaro quando se vira para o aproveitamento dos subsídios estatais por parte de matriarcas que procriam com regularidade apenas para garantir os cheques da segurança social.
A aceitação muda desta situação para o exterior difere da crítica interna a esta rendição. A lealdade social torna-se cumplicidade.
Como estas contradições ocorrem a nível local, assim elas se manifestam como um todo mais significativa naquela faixa de Estados Unidos.
O Rust Belt que agora votou em Donald Trump, votou por duas vezes em Obama. O autor alega que o fizeram apesar da diferença que sentiam para ele e os atemorizava.
Obama era um homem com uma vida estruturada como eles nunca conseguiriam alcançar. Um homem com Educação, com um trabalho de aprumo e com uma família exemplar.
Há neste povo a busca, para a posição de poder, de uma personalidade que seja o mais diferente da sua. Se possível diferentes entre si regularmente.
Neste pedaço dos Estados Unidos, elegeu-se George W. Bush, Barack Obama e, agora, Donald Trump. Sempre os candidatos de personalidade mais impositiva - amedrontante para os hillbillies - mesmo se não a melhor para o futuro deles.
Homens com um legado em nome próprio, mesmo quando inseridos numa família. Homens (aparentemente) bem sucedidos apesar das más fundações em que assentam: as falências dos dois Republicanos e a situação familiar do Democrata.
A pertença torna-se numa recusa da mudança estrutural quando o território se tornou ermo de oportunidades.
A lealdade torna-se na incapacidade para compreender as característica da nova América que continua a progredir.
A independência torna-se numa incapacidade para aceitar as devidas intervenções que o
Nada disto é absoluto e Vance aborda a preguiça que se impôs aquando da perda dos trabalhos que eram a coluna vertebral dos Estados Unidos.
Este é o ponto em que se começam a notar as contradições internas dos que clamam por mudanças sem fazer algo para isso.
Há uma crítica que se sente ser mais feroz quando fala dos que se recusam a lutar em benefício próprio e preferem repetir lamentos por um passado próspero que, em certos casos, nem chegaram a conhecer.
Uma crítica que atinge o seu píncaro quando se vira para o aproveitamento dos subsídios estatais por parte de matriarcas que procriam com regularidade apenas para garantir os cheques da segurança social.
A aceitação muda desta situação para o exterior difere da crítica interna a esta rendição. A lealdade social torna-se cumplicidade.
Como estas contradições ocorrem a nível local, assim elas se manifestam como um todo mais significativa naquela faixa de Estados Unidos.
O Rust Belt que agora votou em Donald Trump, votou por duas vezes em Obama. O autor alega que o fizeram apesar da diferença que sentiam para ele e os atemorizava.
Obama era um homem com uma vida estruturada como eles nunca conseguiriam alcançar. Um homem com Educação, com um trabalho de aprumo e com uma família exemplar.
Há neste povo a busca, para a posição de poder, de uma personalidade que seja o mais diferente da sua. Se possível diferentes entre si regularmente.
Neste pedaço dos Estados Unidos, elegeu-se George W. Bush, Barack Obama e, agora, Donald Trump. Sempre os candidatos de personalidade mais impositiva - amedrontante para os hillbillies - mesmo se não a melhor para o futuro deles.
Homens com um legado em nome próprio, mesmo quando inseridos numa família. Homens (aparentemente) bem sucedidos apesar das más fundações em que assentam: as falências dos dois Republicanos e a situação familiar do Democrata.
Perante isto, não é definitivo que a surpresa (nossa, pois há que lembrar que até Michael Moore alertou para ela) esteja explicada neste livro.
Mais certo é ele abrir dúvidas sobre o que se passará daqui por três anos, aquando das novas eleições presidenciais.
O risco corrido na mudança pela mudança pode ser facilmente mudado se houver um candidato mais interessante a opôr-se ao actual presidente americano, pois há que lembrar que no Rust Belt ambos os anteriores candidatos tinham taxas de desaprovação maiores do que as de aprovação.
Esse é um tema para acompanhar nos jornais. Este livro não quer ter fazer essa análise, apenas dá novas bases aos que queiram pensar este asssunto.
Este é um livro emocional, uma viagem política a uma geografia que nos era desconhecida, feita através dos meandros da família.
A sinceridade de J. D. Vance com a história dos seus é aquilo com que ele conquista leitores e lhes dá lições que se desprendem do tema central sem o texto ser direccionado para tal.
Este é um livro que beneficiou da conjectura para atingir mais leitores. Seria uma belíssima leitura que se fazia acompanhar de um ganho de consciência mesmo sem isso.
Lamento de Uma América em Ruínas (J. D. Vance)
Publicações Dom Quixote
1ª edição - Julho de 2017
280 páginas
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