No posfácio do livro a autora diz que quis escrever como se libertada de todas as regras. Que a "escrita fosse como uma febre" e o resultado um "rock 'n' roll" literário.
Ler isto no posfácio proporciona uma clarividência sobre aquilo que se leu e que não se saberia desde logo enquandrar.
Um texto de uma energia ininterrupta que é um relato biográfico bastante preciso - jornalístico até certo ponto - interrompido por momentos em que a objectividade sobre o passado dá lugar a um discurso directo e torrencial que penetra profundamente na realidade da depressão do qual o distanciamento não nos pode dar uma visão completa.
Pode-se dizer que é como a letra de uma canção funcionando como uma narrativa (poética, eventualmente) interrompida por refrões menos controlados mas emocionalmente mais ferozes.
Capítulo a capítulo, estrutura-se um álbum em movimento contínuo. Um estrutua de canções entre o êxtase e a dormência, mas sempre feitas de refrães que não dão descanso à alma.
Essa dimensão emocional pauta o livro como manifesto sobre a depressão e como ela se manifesta nas formas mais intensas.
Adiciona ao livro um sentido de interiorização que deve chegar a todos, acerca da consciência do que é a depressão e, não sei se como dos limites que devem imperar sobre o uso de tal palavra por leigos.
Sobretudo aos jovens imersos numa cultura de glorificação da depressão.
Essa é, aliás, uma implicação importantíssima do livro - ainda que não explorada em demasiada - sobre a exploração comercial que se alimenta das fases depressivas dos jovens. E, portanto, as promove.
Não só pela parte da indústria farmacêutica mas também cultural, com o caso do rock (e, em particular à época a que a autora se refere, o grunge) a servir de exemplo liderante.
Não se trata, em qualquer dos dois casos, de uma exploração cínica em busca de polémica, pois a autora não despreza os muitos casos reais de depressão que exigem medicação ou que se exprimem pela criação.
A autora não despreza a necessidade das receitas prescristas ou a autenticidade das letras escritas, lança o aviso a todos os que acabarão por lidar com uma doença cada vez mais comum e que não necessita de exageros.
Chamada de atenção para a falta de ponderação nas implicações das decisões comerciais - cuja prioridade é colocada ao nível dos doentes/consumidores.
Um aviso escrito pela exposição total de quem viveu em depressão desde que, aos dozes anos, tentou concretizar uma primeira tentativa de suicídio e que experimentou todos os tipos de medicação.
Há que respeitá-lo pela coragem com que é feito mas creio que, sobretudo, há que lê-lo pela maneira como é conseguido.
Nação Prozac (Elizabeth Wurtzel)
Editorial Presença
2ª edição - Novembro de 2003
360 páginas
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