A diferença entre o policial e o thriller é a diferença literária entre a execução e a enumeração.
Esta afirmação não será universal, mas ao fim de Vermelho da Cor do Sangue foi ela que me surgiu, não como uma revelação mas como uma aceitação da inevitabilidade.
Um thriller não pode ficar à espera do último capítulo para, numa cena montada para o efeito, fechar a narrativa e revelar o cerne do mistério que alimentou as suas páginas.
O thriller tem de seguir a repetição de uma estrutura mais curta, acção-revelação-acção, e depois garantir que a estrutura global funciona para lá disso.
A leitura torna-se, sobretudo, num exercício de espera. A cada desenvolvimento da trama suportamos algumas páginas de perseguições, confrontos ou vigilâncias e depois voltamos à parte substancial da história.
Isto é a causa de o livro ler-se de um fôlego só - uma qualidade que costuma ser muito relevante. E acredito que os fãs do género não deverão ficar senão contentes de encontrarem a mesma qualidade dos thrillers de paragens anglófonas.
Até porque Pedro Garcia Rosado liga o pós-25 de Abril com o presente e, mais importante ainda, o nosso país com a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas com bastante agilidade.
Só que a agilidade não disfarça a pouca credibilidade da forma como ele o faz, através da aparição (e perseguição) de uma injustificadamente bem preservada relíquia, altamente incriminatória, de um crime de quatro décadas atrás.
O presente, neste caso, é muito menos interessante do que o passado. Aliás, o seu interesse é como consequência desse passado que merecia mais protagonismo - e bem o poderia ter, considerando a agitação do Verão Quente.
Há, por isso, um inevitável desfasamento entre a acção que ocupa o Portugal de 2012 e a reflexão que fala do Portugal que nascia em 1975.
Pedro Garcia Rosado pensou numa intriga que, além do interesse que tem como policial nos meandros políticos, o tinha como retrato crítico da cultura dominante na nossa sociedade.
O livro não consegue fazê-lo porque a acção é a parte maioritária do livro. E, em seu maior prejuízo, as intrigas de curta duração que têm de fazer mover os personagens acabam por tornar previsível o que o largo intervalo de tempo entre causa e consequência devia ajudar a esconder.
Direi, por isso, que o livro funciona como entretenimento e revelação de que há escritores na nossa língua com talento para o género que outros fazem com mais regularidade. Mas podia funcionar como algo mais.
Faltou-lhe alguma sabedoria - que a prática deverá trazer consigo - para tomar algumas decisões mais perspicazes e usaria uma associação simples para o demonstrar.
Lendo-se o título sem o acompanhamento do desenho da capa, parece tolo como uma das afirmações de Jacques de la Palisse. Mas se lhe tirassem o "vermelho" o seu poder de sugestão era maior e ficaria bem complementado pelo design da capa sem parecer redundante.
Vermelho da Cor do Sangue (Pedro Garcia Rosado)
Edições Asa
1ª edição - Julho de 2011
304 páginas
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