Deixei passar algum tempo até contar esta história para não deixar demasiado evidente o livro a que se refere.
Sentei-me num cadeirão confortável de uma biblioteca, mais convidativo do que os de casa. Biblioteca moderna, com larga oferta de livros e filmes, com instalações que são uma verdadeira mordomia para os utentes.
Sentei-me com o livro escolhido e fui pelas páginas afora saciando-me com aquelas brilhantes páginas.
Isto até ao momento em que, no movimento de folhear, sinto uma página grossa demais. O elemento estranho no livro fez-me parar e nessa altura apercebi-me de que não era uma página mais grossa mas duas páginas ainda juntas pela sua extremidade.
Achei a situação engraçada, mas na sede da leitura limitei-me a puxar do meu canivete e abrir aquelas páginas.
Avançando mais um pouco a situação repete-se. E novamente lá mais para a frente. E de novo e de novo e de novo...
Fui sempre abrindo as páginas com o cuidado de preservar o livro e não fazer barulho que me denunciasse, não fosse alguém olhar para um gesto justificado como uma agressão ao livro.
Comecei a perguntar-me sobre aquele livro. Sobre o (muito) tempo que tinha passado naquelas prateleiras sem que ninguém o abrisse. Sem que ninguém lhe tocasse senão para o contabilizar no inventário ou para o mudar de secção.
Depois não continuei essa reflexão com amargura, não pensei na falta de leitura do livro e de todos os outros que ali deviam estar nas mesmas condições. Não pensei na quantidade de espaços dedicados aos livros que morrem a pouco e pouco porque ninguém os utiliza.
Continuei, isso sim, por pensar na vida dos livros, na relação única que estabelecemos com cada livro.
Deixei-me levar pelo prazer de crer que aquele livro estava a guardar-se para um leitor. Que o livro me tinha escolhido para que eu lhe insuflasse as páginas de vida, abrindo-as ao mundo pela primeira vez.
Libertando o que o livro tinha para dizer, recebendo-o e dando-lhe algo de volta.
Como um leitor procura um livro que o transforme, também um livro poderá procurar um leitor que o cuide.
O livro prestava-se a este discorrer dos pensamentos, mais interessante e pessoal e menos amargo para com o resto da população. E ainda bem.
Hei-de voltar àquela biblioteca e hei-de reencontrar aquele livro, quase de certeza ainda intocado, ainda o meu livro a aguardar um pouco mais de convivência, um pouco mais de vida!
Sentei-me num cadeirão confortável de uma biblioteca, mais convidativo do que os de casa. Biblioteca moderna, com larga oferta de livros e filmes, com instalações que são uma verdadeira mordomia para os utentes.
Sentei-me com o livro escolhido e fui pelas páginas afora saciando-me com aquelas brilhantes páginas.
Isto até ao momento em que, no movimento de folhear, sinto uma página grossa demais. O elemento estranho no livro fez-me parar e nessa altura apercebi-me de que não era uma página mais grossa mas duas páginas ainda juntas pela sua extremidade.
Achei a situação engraçada, mas na sede da leitura limitei-me a puxar do meu canivete e abrir aquelas páginas.
Avançando mais um pouco a situação repete-se. E novamente lá mais para a frente. E de novo e de novo e de novo...
Fui sempre abrindo as páginas com o cuidado de preservar o livro e não fazer barulho que me denunciasse, não fosse alguém olhar para um gesto justificado como uma agressão ao livro.
Comecei a perguntar-me sobre aquele livro. Sobre o (muito) tempo que tinha passado naquelas prateleiras sem que ninguém o abrisse. Sem que ninguém lhe tocasse senão para o contabilizar no inventário ou para o mudar de secção.
Depois não continuei essa reflexão com amargura, não pensei na falta de leitura do livro e de todos os outros que ali deviam estar nas mesmas condições. Não pensei na quantidade de espaços dedicados aos livros que morrem a pouco e pouco porque ninguém os utiliza.
Continuei, isso sim, por pensar na vida dos livros, na relação única que estabelecemos com cada livro.
Deixei-me levar pelo prazer de crer que aquele livro estava a guardar-se para um leitor. Que o livro me tinha escolhido para que eu lhe insuflasse as páginas de vida, abrindo-as ao mundo pela primeira vez.
Libertando o que o livro tinha para dizer, recebendo-o e dando-lhe algo de volta.
Como um leitor procura um livro que o transforme, também um livro poderá procurar um leitor que o cuide.
O livro prestava-se a este discorrer dos pensamentos, mais interessante e pessoal e menos amargo para com o resto da população. E ainda bem.
Hei-de voltar àquela biblioteca e hei-de reencontrar aquele livro, quase de certeza ainda intocado, ainda o meu livro a aguardar um pouco mais de convivência, um pouco mais de vida!
Adorei o post :)
ResponderEliminarA relação única que temos com cada livro...